
Em entrevista ao programa Agenda da Semana, da Rádio Folha 100.3 FM, a médica ginecologista e obstetra Eugênia Moura, representante da Associação de Ginecologia e Obstetrícia de Roraima, trouxe à tona dados sobre a mortalidade materna e infantil no estado. Segundo ela, Roraima registra uma taxa de mortalidade materna três vezes superior à média nacional, com 145,2 óbitos por 100 mil nascidos vivos em 2022, contra 54,5 no Brasil.
Dados alarmantes e causas
A médica destacou que a mortalidade materna é um indicador crítico da qualidade da assistência à saúde. De acordo com ela, os dados são do Painel de Mortalidade Materna, do Ministério da Saúde.
“A taxa de mortalidade materna em Roraima foi de 145,2 óbitos por 100 mil nascidos vivos em 2022. Se compararmos com a taxa nacional, estamos quase três vezes acima da média”, afirmou. Entre as principais causas estão hemorragias pós-parto, infecções, complicações obstétricas e pré-eclâmpsia.
Eugênia Moura criticou a falta de investimento em infraestrutura e a desorganização do sistema de saúde. “A mortalidade materna reflete a fragilidade do sistema. Falta estrutura, falta UTI materna, falta comunicação entre os setores”, disse. Ela também apontou a alta taxa de cesarianas como um fator agravante. “Nós temos um índice muito alto de cesariana aqui, o que aumenta o risco de complicações como hemorragias e rotura uterina”, explicou.
Falta de estrutura e sobrecarga de trabalho
A médica descreveu a situação precária da Maternidade Nossa Senhora de Nazareth, única do estado. “Cheguei a ficar sozinha em um plantão, com apenas dois estudantes de medicina me ajudando. A sobrecarga de trabalho afeta a saúde dos profissionais e a qualidade do atendimento”, relatou. Ela também destacou a falta de equipamentos e medicamentos essenciais. “Faltam antibióticos, água destilada e até equipamentos básicos como ultrassonografias na emergência”, disse.
Eugênia Moura ressaltou a necessidade de uma UTI materna funcional. “A UTI materna existe no papel, mas não funciona na prática. Isso é um dos fatores que contribuem para as mortes”, afirmou.
Mortalidade infantil e gravidez na adolescência
A médica também abordou a mortalidade infantil, que está diretamente relacionada às condições de saúde das mães. “Temos um índice alto de prematuridade e de mães adolescentes, o que agrava a situação”, explicou. Ela destacou a importância de um pré-natal de qualidade e de políticas de saúde reprodutiva. “Enquanto não reduzirmos a gravidez indesejada e não melhorarmos o pré-natal, esses números continuarão altos”, afirmou.
Em resposta às declarações da médica, a Secretaria de Saúde de Roraima (Sesau) emitiu uma nota apontando dados da própria pasta e criticando o posicionamento da médica.
A Secretaria de Saúde esclarece que no período de 2015 a 2024, o Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth registrou 102 mortes maternas. A seguir:
2015: 07
2016: 03
2017: 04
2018: 08
2019: 06
2020: 10
2021: 18
2022: 19
2023: 14
2024: 13É importante salientar que a Maternidade Nossa Senhora de Nazareth é a unida unidade de alto risco do estado de Roraima e absorve o atendimento de população imigrante e indígenas, sendo a ausência do pré-natal o fator mais agravante que contribui para os dados de mortalidade materna.
Acrescenta-se ainda que, os dados do IBGE divulgados em 2024, apontam que a mortalidade materna está associada, em sua maioria, à hipertensão arterial da gravidez (20%), hemorragias (12%), infecção puerperal (7%) e aborto (5%) e acontece durante a gestação ou dentro de um período de 42 após o término da gravidez.
As causas são evitáveis se o pré-natal for feito de forma adequada na Atenção Primária (postos de saúde/UBS) ou se for de risco, no Centro de Referência de Saúde da Mulher, unidade vinculado à Sesau.
É importante pontuar ainda que desde novembro de 2024 até hoje (24 de fevereiro de 2025) não houve registro de morte materna na Maternidade.
A respeito da servidora fonte da reportagem, a Sesau informa que a Polícia Civil de Roraima instaurou inquérito policial para apurar os fatos e a investigação ocorre em sigilo.
Paralelo, a Sesau abriu Procedimento Administrativo Disciplinar para apurar a conduta da servidora.
Eugênia Moura defendeu a necessidade de diálogo entre governo, sociedade e profissionais de saúde para melhorar o sistema. “Precisamos de uma rede integrada, com pré-natal de qualidade, equipes treinadas e uma UTI materna funcional. Sem isso, as mortes continuarão ocorrendo”, afirmou. Ela também destacou a importância de políticas de saúde reprodutiva e educação sexual para reduzir a gravidez na adolescência.
A médica finalizou com um apelo: “A mortalidade materna não é apenas uma estatística. São vidas perdidas que poderiam ser salvas com um sistema de saúde mais organizado e humano”.