Em meio ao pior ano da história para mortes pela dengue, com 5.008 ocorrências em 2024, segundo o Painel de Monitoramento de Arboviroses do Ministério da Saúde, intensifica-se o alerta sobre o risco de aumento de casos dessa e de outras arboviroses, como zika e chikungunya. Para ter resultados positivos, é preciso investir em estratégias de comunição que vão além de “evite água parada”. É o que revela estudo do Unicef, lançado nesta quinta-feira (24), com apoio da biofarmacêutica Takeda.
A pesquisa tem o objetivo de revelar como indivíduos e comunidades se relacionam com arboviroses e quais aspectos motivam ou dificultam a adoção de práticas de prevenção. Segundo Luciana Phebo, chefe de saúde do Unicef no Brasil, tomar ou não uma atitude diante desse cenário depende de uma confluência de fatores, comportamentos, normas sociais, infraestrutura e acesso a políticas públicas.
“O senso comum diz que quando alguém tem uma informação sobre o que é bom para si próprio e sua família, adota um comportamento ou hábito. Mas há uma diferença entre o que as pessoas falam que fazem e os hábitos que efetivamente incorporam em suas rotinas diárias. […] São esses aspectos que revelamos nesse estudo”, explica Luciana.
O estudo foi realizado a partir de uma revisão de literatura, seguida por pesquisa de campo e entrevistas em algumas cidades do país. Quanto aos aspectos que motivam ou dificultam a adoção de práticas de prevenção do Aedes Aegypti, eles foram organizados em três níveis:
Fatores psicológicos relacionados à prevenção do mosquito:
- Histórico de infecção e percepção de risco: Quem nunca teve a doença, tende a não acreditar na gravidade. A percepção de risco e as práticas de prevenção podem aumentar em situação de epidemia, mas relaxar quando não há.
- Esforço: As práticas preventivas – incluindo limpeza de calhas, caixas d’água e locais de difícil acesso – são vistas como algo difícil, demorado, complexo, para o qual as pessoas não têm tempo ou disponibilidade.
- Custos financeiros: Especialmente em locais mais vulneráveis, gastar recursos para a limpeza de caixa d’água, compra de repelentes, entre outros, pode não ser viável.
Fatores sociológicos:
- Organização coletiva. Participar de organizações de bairro está associado a um aumento das práticas de prevenção. Mas, em várias regiões, muitas pessoas não conhecem seus vizinhos, não se veem como parte de um grupo, e não há uma organização coletiva para cuidar do bairro.
- Influência comunitária. Muitas pessoas se sentem moralmente obrigadas a cumprir práticas de prevenção que acreditam que é esperado delas.
Fatores estruturais:
- Estrutura urbana. A falta de coleta de lixo e a presença de terrenos baldios estimula o descarte inadequado de lixo.
- Ação dos agentes de endemia. A atuação dos agentes está associada à diminuição das arboviroses. Em alguns lugares, no entanto, pode não haver agentes suficientes, ou pode haver obstáculos na relação dos agentes com a comunidade.
- Confiança no poder público. A baixa confiança nos órgãos de governo pode ser uma barreira para que se siga orientações de saúde e prevenção.
Para enfrentar os fatores que impactam nas atitudes da população para prevenir as arboviroses, a pesquisa traz algumas recomendações:
- Associar o controle vetorial a comportamentos vistos como “desejáveis” pela população: Algumas práticas úteis para o controle do mosquito, como manter a casa limpa ou não jogar lixo na rua, já são realizadas com outras motivações, ligadas à organização, limpeza e estética.
- Aumentar a percepção de risco: O estudo observou que há uma percepção elevada do risco de infecção pelos pais quando relacionada às crianças, por medo de que seus filhos estejam infectados. Essa percepção poderia ser usada de forma mais eficaz em campanhas de comunicação sobre riscos e no envolvimento da comunidade em ações preventivas.
- Reduzir custos e esforços associados à adoção de comportamentos de prevenção: Investir em políticas públicas que diminuam o custo e os esforços de práticas de prevenção podem ter um efeito significativo em reduzir arboviroses.
- Investir em melhorias na infraestrutura e na limpeza urbana.
Por fim, a pesquisa enfatiza a importância de avaliar de forma estratégica como engajar a comunidade e realizar ações comunitárias, além de estimular e mediar discussões sobre o tema.
“Sabemos da importância de garantir, para cada criança, o direito de viver em um ambiente livre de doenças que possam afetar não somente sua saúde física, como também impactar na frequência escolar e na rotina de uma criança. Esperamos que esse estudo possa contribuir com as políticas públicas e ações de comunicação nacionais e em cada município, com foco em mudanças de comportamento necessárias ao combate ao Aedes”, defende Luciana Phebo.