O documentário “O Golpista do Tinder” (2022) produzido pela Netflix fala sobre a história de um rapaz que seduzia mulheres em um aplicativo de relacionamentos e as extorquia, deixando-as em prejuízos de milhares de dólares. As parceiras se submetiam aos pedidos do homem, que dizia estar apaixonado por elas e as aplicava o golpe.
Pensando nisso, a FolhaBV entrevistou uma psicóloga para saber sobre os primeiros sinais de que seu parceiro pode ser um abusador e como sair dessa situação.
Primeiros sinais
Segundo a psicóloga especialista em neuropsicologia Julia Arnaud (CRP 20/8833), o relacionamento abusivo pode partir tanto de homens, quanto de mulheres e pode ser em relações hetero ou homossexuais. Ambos os gêneros começam a dar os mesmos sinais sutis na relação.
“Nesse primeiro contato você já identifica alguns sinais sutis. Geralmente o abusador envolve o parceiro de uma forma que não fique clara. Com o passar do tempo é que os sinais vão surgindo. Por exemplo, o ciúme excessivo. Somos ensinados no decorrer da vida de uma forma muito disfuncional que o ciúme é sinônimo de amor, de afeto. Mas o ciúme em excesso não pode ser saudável no sentido de posse, de controle. São comuns frases como ‘Eu confio em você, mas não confio nas outras pessoas’, ’Eu quero cuidar de você’, ‘Eu estou fazendo isso pro seu bem’”, afirmou a psicóloga.
Sentimento de culpa
No vídeo abaixo, a profissional explica como o abusador faz com que a vítima se sinta culpada das ações do próprio abusador.
A tendência é que, a partir dessa culpa, o abusador queira controlar o comportamento do parceiro, fazendo com que a vítima se acostume em ceder as próprias vontades.
“A grande questão é que a maioria dos abusadores objetificam a parceira. Eles acreditam que elas são coisas, são objetos que pertencem a eles. Por isso a dificuldade de respeitar, porque se você é minha, então você tem que fazer aquilo que eu quero. As coisas vão ser do meu jeito porque você é minha. Então ele não vê como uma mulher, não vê como outra pessoa”, destacou Julia.
Eu posso mudar o meu parceiro?
Ao observar e concluir que a vítima está em um relacionamento abusivo, pode surgir o questionamento “Devo acreditar que eu posso mudar o meu companheiro?”. Julia afirma que o indicado é buscar ajuda profissional.
“É preciso ter muito cuidado com esse ‘complexo de Salvador’. São comportamentos tóxicos e abusivos que não tem a ver só com a parte superficial da estrutura psíquica dessa pessoa, é algo enraizado. Então, uma pessoa que tem esse comportamento precisa passar pela psicoterapia, ressignificar muitas coisas, pois ela foi internalizando esses padrões. Então, isso para ela é normal. Pessoas abusivas não consideram que são abusivas, elas muitas vezes não conseguem enxergar que elas agem dessa forma e que isso não é saudável”, explicou a profissional.
A agressão física
De acordo com a psicóloga, os comportamentos citados acima podem anteceder a fase mais extrema de um relacionamento abusivo: a violência física e psicológica.
“É o último estágio. Mas para chegar nesse estágio outras coisas já aconteceram (que foram esses sinais pontuados). Então num primeiro momento, às vezes ele começa a quebrar as coisas em casa, começa a chutar a parede. Só que com o passar do tempo, a tendência é que essas ações sejam voltadas para a vítima. Portanto, perceber essas agressões em objetos já é um sinal de alerta”, pontuou.
Além disso, a violência psicológica (danos emocionais que prejudiquem o pleno desenvolvimento da mulher) e violência doméstica são crimes, em que a vítima pode denunciar no disque 180. A pena de reclusão para os crimes podem chegar em até quatro anos.
Como procurar ajuda
Se você é a vítima
Após notar os sinais citados acima, a psicóloga orienta a buscar apoio com pessoas queridas e ajuda profissional:
“Conversar com a família, conversar com amigos, para que eles possam encorajar e auxiliar nesse processo de procurar uma ajuda profissional. Mas a melhor forma é através de ajuda profissional. Porque primeiro é preciso entender o que fez a vítima se conectar com a pessoa desse jeito. E o que fez a gente se manter dentro dessa relação por tanto tempo”
Se você conhece a vítima
Quando a pessoa está muito envolvida com o abusador, isso pode atrapalhar a vítima a enxergar o que ela está passando. Existe a dificuldade de conseguir diferenciar a linha tênue entre o afeto e o controle.
“Num primeiro momento dizer: ‘Olha, talvez você não esteja percebendo alguns sinais por você está muito envolvida emocionalmente com essa pessoa. Mas a gente que está de fora tem percebido tais aspectos. Se a gente for analisar, você de fato deixou de fazer algo que você goste? Você se isolou de outras pessoas?”, orientou a profissional.