O câncer que atingiu o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, falecido neste domingo, 16, é um tipo específico da doença e atinge a região na transição entre estômago e esôfago (cárdia). Segundo especialistas, o caso está “fora da curva”, pois a doença é mais comum entre os 65 e 74 anos. Por sua vez, a doença apresenta uma prevalência crescente na população mais jovem por conta de fatores de risco crescente na população brasileira, como refluxo e obesidade.
O tumor de Covas surgiu na cárdia, espécie de válvula entre o estômago e esôfago e, no diagnóstico, havia foco no fígado e linfonodos. Segundo o cirurgião oncológico Alexandre Ferreira Oliveira, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), a sobrevida média de pacientes com esse diagnóstico é de 8 a 18 meses. “É possível pensar em cura para este tipo de câncer quando o diagnóstico é feito em fase inicial. Quando ele já está em fase metastática, não se pode falar em cura, mas em sobrevida”, afirma Oliveira.
Assim como Bruno Covas, que foi apresentou recentemente focos de metástase nos ossos e fígado, uma parcela considerável de pacientes oncológicos se vê em situação semelhante. Após a doença regredir de forma parcial ou por completo, evolui novamente. A volta da doença, chamada de recidiva, é mais comum nos cinco anos após o início do tratamento, principalmente nos casos de prognóstico mais desfavorável.
Oliveira explica que a piora acelerada do prefeito coincide com o espalhamento da doença para regiões importantes do corpo. “Quando a doença chega aos ossos é pelo fato dela já estar na corrente sanguínea, causando um comprometimento sistêmico. Essa evolução é muito rápida porque as células tumorais começam a se disseminação descontrolada das células ocorre com grande rapidez”, explica.
De acordo com o cirurgião oncológico, o tratamento do câncer de estômago depende, portanto, do estágio da doença. Nos casos em que não há metástase, a indicação é a cirurgia para a remoção do tumor. Na doença metastática, a opção é o controle da doença com quimioterapia, radioterapia e imunoterapia.
Números do câncer gástrico
O câncer de estômago, também chamado de câncer gástrico, é um dos mais incidentes no país. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), são mais de 21 mil novos casos previstos para 2021, sendo o quarto mais comum em homens e o sexto em mulheres no Brasil. Em âmbito mundial, são registrados mais de 1 milhão de novos casos por ano, segundo o levantamento Globocan 2020, da Organização Mundial da Saúde, configurando a doença como o quinto câncer mais diagnosticado.
Dentre todos os tumores malignos que acometem o estômago, 90% a 95% são adenocarcinomas. Dentre todos os adenocarcinomas, há um subtipo que ocorre na transição esofagogástrica, uma região do trato digestivo que corresponde à passagem do esôfago para o estômago e está situada normalmente entre o tórax e o abdômen.
Esta região, chamada cárdia, é responsável pelo controle do fluxo normal dos alimentos no sentido do esôfago para o estômago. Ao longo desse caminho pode inclusive ocorrer o refluxo, que é quando o conteúdo gástrico retorna para o esôfago. Além do aumento em todo o mundo associado à alta incidência refluxo e obesidade, há também forte associação deste câncer com o tabagismo.
Estudo publicado pelo Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH) compara a prevalência da doença, década a década. O subtipo de transição gastroesofágica saltou de 15.7% dos tumores gástricos nos anos 1970 para 32% na última década. A prevalência é maior em homens brancos entre 65 e 74 anos, mas é crescente a sua incidência na população mais jovem.
Prevenção e COVID-19 – É fundamental manter a rotina de exames e tratamento durante a pandemia de COVID-19. Quando a doença é diagnosticada em fases bem iniciais e o risco de ter havido metástases, mesmo que microscópicas, é pequeno, a cirurgia oncológica é o tratamento mais eficaz. Em casos de maior risco para a ocorrência de metástases, especialmente quando os gânglios próximos ao tumor se mostram comprometidos, o tratamento deve envolver a realização de quimioterapia e a seguir a cirurgia oncologicamente adequada. E em casos com metástases, o tratamento padrão é a quimioterapia, sendo o tratamento cirúrgico reservado para casos selecionados.
Em linhas gerais, a metástase é o evento no qual as células do tumor se alojaram em outros órgãos após deslocamento, principalmente pela corrente sanguínea. No câncer gástrico da junção gastroesofágica ocorre principalmente no fígado e pulmões; ou ainda pela corrente linfática, mais especificamente nos gânglios, conhecidos popularmente como ínguas. Outros focos, menos comuns, são os ossos e a cavidade abdominal.
“A mensagem que queremos deixar é que o cuidado precisa ser permanente. “Em fases iniciais, estes tumores não apresentam sintomas ou são inespecíficos, se assemelhando aos sinais de refluxo, como a pirose (queimação). O principal sinal de tumor em si costuma ser a dificuldade ou dor na transição do tórax para o abdômen após engolir os alimentos. Essa condição é causada pelo estreitamento da passagem entre os órgãos”, aconselha Alexandre Ferreira Oliveira.
Para prevenir a doença, a melhor dica, ressalta o especialista, é manter-se saudável, com peso normal e com hábitos de vida que incluam atividade física e boa alimentação. Além disso, recomendamos não fumar e nem beber. Se você tem refluxo, procure assistência médica e acompanhe seus sintomas. Um exame de endoscopia pode ser indicado por seu médico.
Sobre a SBCO – Fundada em 31 de maio de 1988, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO) é uma entidade sem fins lucrativos, com personalidade jurídica própria, que agrega cirurgiões oncológicos e outros profissionais envolvidos no cuidado multidisciplinar ao paciente com câncer. Sua missão é também promover educação médica continuada, com intercâmbio de conhecimentos, que promovam a prevenção, detecção precoce e o melhor tratamento possível aos pacientes, fortalecendo e representando a cirurgia oncológica brasileira. É presidida pelo cirurgião oncológico Alexandre Ferreira Oliveira (2019-2021).