O fenômeno migratório pode ser visto também como uma oportunidade de desenvolvimento. Muitas famílias atingidas diretamente pelas dificuldades econômicas e de outros conflitos, deixaram suas regiões de origem, em busca de sobrevivência.
Exemplo disso foi a família de Domingo Linares, chegou em Boa Vista cruzando uma série de obstáculos que, por muitas vezes, o fez acreditar que estaria para sempre atada à crise venezuelana. Para Domingo, a viagem foi uma montanha russa de emoções: o pai teria que deixar a família para trás, entraria primeiro no país para conseguir estabilidade financeira, e depois buscaria a esposa e os filhos.
Domingo Linares, 32, casado com Yusbelis Coromoto, 27, pais de três filhos, a mais velha com 9, o segundo com 7 e o mais novo com 5 anos. Deixaram o País de origem em busca de uma vida melhor, “nunca pensamos em sair da Venezuela, mas o país está em situação de extrema pobreza”, disse.
Na Venezuela, o pai trabalhou como soldador em uma fábrica. Até que a crise atingiu a família, desde então o casal passou a comprar verduras para revender em uma banca de feira. “Nós vendíamos tomate, cheiro verde, cebola, repolho, pimentão e batata. Comíamos bem, a casa era própria e tínhamos dinheiro para cuidar das crianças”, relatou Domingo.
Mesmo se dedicando ao trabalho com carga horária exaustiva o rapaz fala que, continuaria trabalhando na banca de verduras se a inflação não tivesse tornado os valores proibitivos. “Eu acordava as duas da madrugada todos os dias para comprar verduras com um preço acessível, mas no outro dia, o saco de cebola que eu tinha comprado na madrugada anterior por R$ 20, já estava custando R$ 70”, comenta.
O rapaz relata que a família já não conseguia mais comer direito, as crianças já não tinham mais como ir à escola, não tinham roupas nem sapatos, o custo dos produtos eram alto demais. Sem ver outra opção e para deixar a família a salvo, decidiu que levaria todos para o Brasil.
Quando a vida recomeça em um novo chão
A jornada que trouxe Domingo até Roraima é longa e remetente, seu destino final era a capital Boa Vista. Para conseguir chegar viajou durante dois dias. Assim que chegou o rapaz conta que foi morar na rua. “Conseguir um trabalho seria muito difícil, eu não sabia me comunicar e as pessoas não confiavam em ajudar”. Essa não foi a única experiência ruim, o rapaz conta que passou fome, sede e sofreu humilhações de brasileiros durante muitos dias, dormia no chão de banheiros públicos e permaneceu nas ruas de Boa Vista.
O venezuelano diz que trazer a família foi um desafio muito grande, a responsabilidade de ajudá-los era a maior pressão que ele já tinha passado. Não ter condições financeiras para sustentar a esposa e os filhos o deixava muito preocupado, “muitas vezes eu chorava, eu sou homem mas chorava todos os dias, porque eu sentia doer em mim, por não ter como trazer a minha família e por estarem longe de mim”, conta Domingo com os olhos marejados.
Com o passar dos dias o venezuelano foi se adaptando aos costumes e rotina da nova vida, conhecendo novas pessoas e fazendo amizade. Trabalhou fazendo diárias por seis meses, conseguiu juntar dinheiro pra trazer a esposa e os filhos. “Eu não gastava nada, preferia comer pouco, para sobrar mais dinheiro e assim eu conseguiria trazê-los mais rápido, porque eu sei o quanto está difícil a vida na Venezuela”, explicou.
IMDH solidário faz atendimento diário junto aos migrantes (Foto: Divulgação)
IMDH Solidário faz a diferença na vida de muitos
Assim que a esposa chegou na cidade juntamente com os filhos, relata que através de uma amiga ficou sabendo sobre os atendimentos do Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH). Yusbelis Coromoto fala que, foi atendida pelos agentes e se sente muito feliz pelo trabalho exclusivamente para mulheres e crianças, “fui atenciosamente atendida, me sinto feliz por ter chegado em um país desconhecido e ser recebida com a dedicação dos agentes do IMDH Solidário”, relata a jovem.
“Estamos com cinco meses em Roraima, fui abençoada com a bolsa de subsistência e conseguimos alugar um apartamento para sair das ruas, com nossos filhos. Compramos um fogão e botija de gás, recebemos doações para nossas crianças, leite, material escolar, livros didáticos e brinquedos. Também conseguimos comprar com o dinheiro da bolsa, uma bicicleta, teremos um natal muito abençoado”. Disse Yusbelis.
Segundo Yusbelis atualmente ela e o esposo estão trabalhando, ela trabalha como diarista doméstica e o esposo faz trabalhos de soldador, limpa quintais e faz serviços de pedreiro. Todo o dinheiro é revestido para comprar comida, roupas e pagar as despesas da casa. A esposa fala que está agradecida pela recepção dos roraimenses. “Eles perceberam que nós somos pessoas de bem e nos ajudaram muito, nos deram uma oportunidade de termos uma vida sem fome e vivermos tranquilos até quando Deus quiser”, diz com a voz embargada.
De acordo com a agente do IMDH Solidário de Roraima, Gisele Silveira, a responsabilidade de ajudá-los não recai apenas no Estado, mas no mundo inteiro. “É preciso ter uma política coordenada entre órgãos institucionais, governamentais e não governamentais para que se administre a crise Venezuelana ao longo de toda a cadeia de deslocamento da população. Tem de haver também um esforço concatenado entre a população para conter a violência, com a iniciativa de boas práticas e acolhimento”, Finaliza a Agente.